Usando Generics no Go
Como todo mundo que trabalha com a linguagem deve saber, o Golang nasceu sem tratamento de tipos genéricos. De fato, não era uma preocupação no momento, afinal, ele nasceu pra ser simples e performático e, infelizmente, esse tipo recurso não ajuda nisso. Porém, o Go evoluiu para além de pequenas aplicações executando processos pesados e hoje é encontrado em praticamente tudo: aplicações web, bibliotecas, CLIs e aquilo ignorado durante sua concepção começou a ser sentido pela sua crescente comunidade.
Afinal, o que são generics?
Se você tem experiência com generics em outra linguagem, talvez esse tópico seja redundante, então não ficarei triste pular para o próximo.
Diferente de linguagens baseadas em script, como JavaScript e Python, o Go é fortemente tipado (assim como Java, C#, entre outras). Isso significa que toda variável deve ser anotada com o seu tipo: inteiro, string e por aí vai.
Pense em uma situação em que você precisa construir uma URL e precisa adicionar parâmetros a ela. Um jeito simples* seria utilizar o método abaixo (* Apenas um exemplo, nunca construa URLs assim 😬).
func AddParam(url, name, value string) string {
if !strings.Contains(url, "?") {
url += "?"
} else {
url += "&"
}
return fmt.Sprintf("%s%s=%v", url, name, value)
}
Isso funciona bem para valores do tipo string
. Mas caso meu parâmetro seja um inteiro, teríamos de escrever outro método:
func AddIntParam(url, name string, value int) string {
if !strings.Contains(url, "?") {
url += "?"
} else {
url += "&"
}
return fmt.Sprintf("%s%s=%v", url, name, value)
}
E isso começa a ficar insustentável à medida que novos parâmetros aparecem.
Uma maneira de evitar essa repetição desnecessária de código, que inclusive funciona praticamente desde sempre no Go é usar o tipo interface{}
:
func AddParam(url, name string, value interface{}) string {
// Nada muda...
}
Porém, isso deixa a abertura de algum desenvolvedor tentar fazer isso. E acredite, algum desenvolvedor vai tentar fazer isso:
type user struct {
Name string
Age int
}
AddParam("www.google.com", "teste", user{
Name: "Alan",
Age: 33,
})
// URL gerada: www.google.com?teste={Alan 33}
E o resultado pode acabar não sendo o esperado, então seria necessário adicionar algumas verificações:
func AddParam(url, name string, value interface{}) (string, error) {
switch v := value.(type) {
case string, int:
return addValidParam(url, name, value), nil
default:
return "", fmt.Errorf("%v is an invalid type", v)
}
}
func addValidParam(url, name string, value interface{}) string {
if !strings.Contains(url, "?") {
url += "?"
} else {
url += "&"
}
return fmt.Sprintf("%s%s=%v", url, name, value)
}
E talvez isso comece a ficar complexo novamente.
Fugindo um pouco do mundo de Golang, no Java, por exemplo, usamos os generics para definir uma estrutura de dados em tempo de execução, como, por exemplo, nas listas:
List<User> list = new ArrayList<>();
list.add(new User("Alan", 33));
list.get(0).SomeMethodFromUser()
Usando o Go 1.18
Os generics estão disponíveis a partir da versão 1.18 do Go, que até o momento em que escrevo esse post ainda não está disponível oficialmente, porém não é complicado instalar a versão de testes. Se você utiliza o Goland ou IntelliJ, basta apenas baixar pela própria IDE:
Ou se preferir, pela própria linha de comando:
go install golang.org/dl/go1.18rc1@latest
go1.18rc1 download
go1.18rc1 run path/to/file.go
Caso esteja utilizado Go Modules, também é preciso configurar o go.mod
para usar a versão correta:
module seu-modulo
go 1.18
Generics no Go
Para não quebrar a compatibilidade da linguagem, a declaração escolhida para tipos genéricos foi a seguinte:
func NomeDoMetodo[NomeDoTipo Tipo](nomeDoPamametro NomeDoTipo) {
//...
}
Confuso? Vamos reescrever nosso AddParam
usando generics:
func AddParam[T any](url, name string, value T) (string, error) {
switch v := value.(type) {
case string, int:
return addValidParam(url, name, value), nil
default:
return "", fmt.Errorf("%v is an invalid type", v)
}
}
Segundo a própria documentação, any
é um sinônimo para interface{}
:
// any is an alias for interface{} and is equivalent to interface{} in all ways.
type any = interface{}
Ou seja, nosso método funciona exatamente como funcionava anteriormente, mas não é exatamente para isso que foi criado os generics. Podemos definir qualquer tipo, que inclusive podem ser vários, o que nos permitiria remover a validação do parâmetro de entrada.
func AddParam[T string | int](url, name string, value T) string {
if !strings.Contains(url, "?") {
url += "?"
} else {
url += "&"
}
return fmt.Sprintf("%s%s=%v", url, name, value)
}
Desta forma, receberíamos um erro em tempo de compilação caso algum parâmetro fuja disso:
AddParam("www.google.com", "teste", user{
Name: "Alan",
Age: 33,
})
// Saída no console: user does not implement string|int
Declarações de interfaces também receberem esse recurso, o que nos permite fazer coisas do tipo:
type ValidParam interface {
string | int | float32 // Ou qualquer outro tipo
}
func AddParam[T ValidParam](url, name string, value T) string {
// Nada muda...
}
E não para por aí
A outra grande vantagem dos tipos genéricos e evitar fazer cast excessivo entre tipos. Vamos imaginar uma aplicação que precise executar operações paralelas, como transferências de arquivos de uma lista de URLs, porém, por limitações do disco e da própria banda, queremos definir um número máximo de workers simultâneos.
Entidade Download
:
type (
Download struct {
url string
}
)
func (d Download) Download(_ context.Context) {
log.Printf("starting download from %s\n", d.url)
// Simulando o tempo de download
ms := rand.Intn(50) * 100
time.Sleep(time.Millisecond * time.Duration(ms))
log.Printf("dowloaded from %s successfuly\n", d.url)
}
func NewDownload(url string) Download {
return Download{
url: url,
}
}
E o nosso worker de download:
type (
Worker struct {
buffer int
}
)
func New(bufferSize int) *Worker {
return &Worker{
buffer: bufferSize,
}
}
func (w Worker) Work(ctx context.Context, items []Download) {
var wg sync.WaitGroup
wg.Add(len(items))
jobs := make(chan Download)
// Cria um número limitado de workers
for i := 1; i <= w.buffer; i++ {
go func() {
for j := range jobs {
// Realiza o download
download.Download(ctx)
wg.Done()
}
}()
}
for _, item := range items {
// Envia um item através de um canal.
// O primeiro worker que receber processa.
// Se todos estiverem ocupados, a execução fica presa
// até algum worker estar disponível.
jobs <- item
}
// Fecha o canal e espera até todos workers ocupados finalizarem.
close(jobs)
wg.Wait()
}
Funcional e bonito. Porém, isso limita o worker a somente lidar com Downloads
:
func main() {
n := 20
downloads := make([]Download, n)
for i := 0; i < n; i++ {
downloads[i] = NewDownload(fmt.Sprintf("https://some-item.com?id=%d", i+1))
}
w := New(5)
w.Work(context.Background(), downloads)
}
Com alguns ajustes, podemos tornar esse worker mais genérico:
package worker
import (
"context"
"sync"
)
type (
Fn func(context.Context, interface{})
Worker struct {
fn Fn
buffer int
}
)
func New(workerFn Fn, bufferSize int) *Worker {
return &Worker{
fn: workerFn,
buffer: bufferSize,
}
}
func (w Worker) Work(ctx context.Context, items []interface{}) {
var wg sync.WaitGroup
wg.Add(len(items))
jobs := make(chan interface{})
for i := 1; i <= w.buffer; i++ {
go func() {
for j := range jobs {
w.fn(ctx, j)
wg.Done()
}
}()
}
for _, item := range items {
jobs <- item
}
close(jobs)
wg.Wait()
}
E, fazendo os casts necessários, temos:
func main() {
n := 20
downloads := make([]interface{}, n)
for i := 0; i < n; i++ {
downloads[i] = NewDownload(fmt.Sprintf("https://some-item.com?id=%d", i+1))
}
downloader := func(ctx context.Context, download interface{}) {
download.(Download).Download(ctx)
}
w := worker.New(downloader, 5)
w.Work(context.Background(), downloads)
}
Funcional, porém nada bonito. Usando generics, podemos encapsular toda essa verbosidade dentro do worker:
type (
Fn[T any] func(context.Context, T)
Worker[T any] struct {
fn Fn[T]
buffer int
}
)
func New[T any](workerFn Fn[T], bufferSize int) *Worker[T] {
return &Worker[T]{
fn: workerFn,
buffer: bufferSize,
}
}
func (w Worker[T]) Work(ctx context.Context, items []T) {
var wg sync.WaitGroup
wg.Add(len(items))
jobs := make(chan T)
for i := 1; i <= w.buffer; i++ {
go func() {
for j := range jobs {
w.fn(ctx, j)
wg.Done()
}
}()
}
for _, item := range items {
jobs <- item
}
close(jobs)
wg.Wait()
}
E nosso método main()
volta a ser (quase) o que era:
func main() {
n := 20
downloads := make([]Download, n)
for i := 0; i < n; i++ {
downloads[i] = NewDownload(fmt.Sprintf("https://some-item.com?id=%d", i+1))
}
downloader := func(ctx context.Context, download Download) {
download.Download(ctx)
}
w := worker.New(downloader, 5)
w.Work(context.Background(), downloads)
}
Podemos inclusive também escrever listas (não confundir com arrays e slices):
type (
List[E any] []E
)
func NewList[E any]() *List[E] {
return &List[E]{}
}
func (l *List[E]) Add(element E) {
*l = append(*l, element)
}
func (l *List[E]) Get(index int) *E {
if index > len(*l) {
return nil
}
return &(*l)[index]
}
E até adicionar filtros (adeus for _, item := range items
?):
func (l *List[E]) Find(filter func(*E) bool) *E {
for index := range *l {
if filter(&(*l)[index]) {
return &(*l)[index]
}
}
return nil
}
func main() {
type user struct {
Name string
Age int
}
// Notem que aqui precisamos definir o tipo na inicialização
// da struct, usando a anotação [user], pois, o compilador
// não teria como inferir esse valor em tempo de execução.
list := NewList[user]()
list.Add(user{
Name: "Alan",
Age: 33,
})
im33 := list.Find(func(u *user) bool {
return u.Age == 33
})
fmt.Println(im33)
// Saída no console: &{Alan 33}
}
Então é isso, galera. Os generics são apenas um dos diversos recursos esperados na versão 1.18 da linguagem que está prevista para sair ainda esse mês, mas eu chutaria só depois do carnaval 😛.